sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Um olho no amanhã, outro no presente.

Demoramos a postar novos textos, pois queríamos ver a capacidade da cidade e, logicamente, dos seus principais atores de produzir novas realidades. Pagamos para ver a emergência de eventos, políticas públicas e tomadas de decisões que tivessem o potencial de mudar um pouco a paisagem que se nos apresenta em Seropédica. Paisagem esta bastante ilustrada aqui no Diário da Lixolândia.
Aquilo que lemos e entendemos como “realidade seropedicense” foi bem esmiuçada nas postagens anteriores, e os temas foram se repetindo. Para piorar, vemos uma grande dificuldade para produzir informações relevantes e confiáveis. Tudo o que chega em Seropédica vem na forma de boato. Pouca coisa aconteceu e até agora continuam os boatos. A exceção fica por conta da informação, em um jornal, sobre a vinda de uma montadora de automóvel para a cidade. Enquanto não se materializa esta possibilidade, a cidade continua carente de acontecimentos que façam-se sentido no longo prazo.
A vinda da montadora chama atenção para algo importante: o poder público municipal e estadual tem condições de planejar e receber um investimento dessa natureza? Será que o governo estadual fará o mesmo que fez com a CSA, implantando um colosso daqueles em meio a uma região cercada de favelas, sem que fossem gastos quaisquer centavos para transformar aquela paisagem urbana degradada? Do dinheiro gasto na CSA, não faria falta alguma o investimento para promover uma reurbanização naquela área mal ocupada. Nada foi feito, e o que temos hoje é uma mega siderúrgica implantada numa área urbana degradada, gerando problemas, enquanto o governo estadual faz parecer que está punindo a empresa. E se fizerem o mesmo em Seropédica, implantando aqui uma montadora, sem que essa paisagem de bairros jogados a beira de uma rodovia seja transformada? Corremos esse risco.
Tudo o que o Diário da Lixolândia queria era ver acontecer mudanças que fizessem deixar no passado o mote “Seropédica – lugar de lixo feliz”. Entretanto, passados exatos 6 meses (a última postagem foi em 29/6/11), a lógica desse mote mantém-se:  Seropédica virou a lixolândia, lugar onde o lixo dos outros recebe mais atenção que a própria população da cidade. Esta, como vemos diariamente, continua agonizando na péssima estrutura de saúde, na beira da rodovia – exposta diariamente a riscos de acidentes –, nas ruas da cidade – onde quem manda são os carros, caminhões e motos –, nos ônibus da Real Rio e da Ponte Coberta, viajando horas para ter acesso a trabalho e serviços essenciais à sobrevivência.
Vamos a alguns tópicos gerais:
  • Trânsito - Infelizmente nada foi feito de relevante em 2011. Este continua caótico, seja pelo volume, seja pela falta de controle do poder público. A prefeitura colocou faixas e moderadores de tráfego em algumas ruas, mas não põe fiscalização, nem promove a educação da população. O resultado é que aquilo ou nada é a mesma coisa. Eles só servem para sinalizar o local exato onde seremos atropelados! Foi colocado asfalto, mas não cuidaram das calçadas (os passeios), fazendo com que as pessoas fiquem perambulando pelas ruas, correndo o risco de se ferir. Já está na hora de transformar algumas vias em mão única, gerenciando melhor os fluxos. A carga e descarga do comércio continua uma bagunça.
  • Ruas - ainda estamos numa época onde se acredita que colocar asfalto em rua é sinal de modernização. O asfalto posto em Seropédica já começa, em algumas ruas, a dar problemas. Principalmente porque não consideraram o peso dos veículos que trafegam, o que solicitava que fosse feita obra de verdade. Infelizmente, colocar asfalto sobre paralelepípedo não é obra de verdade.   
  • Barulho – Seropédica continua uma cidade perigosamente barulhenta. O número de carros de som anunciando festas, informação do comércio e anúncios de políticos só faz aumentar, sem que haja qualquer regulação. Resultado: eles sonorizam onde querem e a hora que bem entender. Com isso, sofrem os colégios, hospitais e os moradores, logicamente. Ainda tem os carros de gás, as motos com escapamento modificado e as pessoas que insistem em usar o som dos veículos em altos volumes. Tudo sem que haja qualquer controle da prefeitura.
  •  A festa do poder público – simplesmente não dá para esquecer o dinheiro público que a prefeitura investiu na propriedade privada onde fica a Secretaria de Educação. É um absurdo, uma falta de respeito que a Câmara de Vereadores abençoou, porque não fez nada para contestar. E o que é mais interessante: a única secretaria que tem investimento para melhorar as condições de trabalho é justamente a ocupada pela esposa do prefeito.
  •  Aterro Sanitário – Seropédica virou a lixeira do Rio de Janeiro e, o que já era esperado, emerge: quem ganhou foi a cidade do Rio de Janeiro e a empresa privada que cuida do lixo de lá. Quem perdeu fomos nós, pois tivemos uma grande porção de terra destinada a uma atividade econômica que não gera benefício qualquer, e que só gera problemas. Onde estão os benefícios?

São muitos os problemas, relatamos apenas alguns. Tem ainda o poder da Nova Dutra; o Arco Rodoviário; o conjunto habitacional no Km 53, à beira da estrada; a Maternidade à beira da estrada; etc. Problemas não faltam em Seropédica. Estamos aqui para ajudar a encontrar soluções.
Apesar de tudo, sempre fica uma esperança no amanhã. Depositar no futuro muitas expectativas é uma tradição antiga, e esta ganha mais notoriedade na mudança de ano.
O Diário da Lixolândia deseja a todos um futuro melhor, sempre. 
Obrigado pelo apoio!


(Infelizmente, ontem, dia 29/12/11, no momento em que este texto era gestado, houve um acidente de trânsito na rua 7, entre uma moto e um carro. O espetáculo revela bem o que sempre falamos aqui: o atendimento médico demorou; as pessoas mexiam nas vítimas, tentavam mudá-las de lugar; os motoqueiros acham-se donos das ruas; colegas dos rapazes da moto pegaram a moto acidentada e a tiraram da cena do crime, e por aí vai. Cenas da crônica de Seropédica. Saúde para os rapazes!)

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Por uma nova agenda para o encontro entre Seropédica e a UFRuralRJ


Recentemente um jornal exibiu a foto de um caminhão da UFRuralRJ despejando no lixão de Seropédica. O texto, criticando a ação, alardeava a universidade como um dos principais atores na luta contra a instalação do Aterro de Seropédica.
O jornal errou. A UFRuralRJ, enquanto organização, teve um papel menor em todo esse processo de transformação de Seropédica em Lixolândia, a lixeira da cidade do Rio de Janeiro . A luta mesmo ficou por conta da ADUR (Associação dos Docentes), Sintur (Sindicato dos Técnicos Administrativos), DCE (Diretório Central dos Estudantes) e alguns professores.
A foto oferece outra contribuição: começar a olhar a UFRuralRJ enquanto cidade e sua contribuição para transformação de Seropédica. Está é uma situação única: é uma organização, uma Instituição Federal de Ensino Superior (IFES) e, devido ao seu porte, uma cidade com milhares de habitantes. Enquanto cidade, a UFRuralRJ apresenta características que a diferencia, mas que não a torna imune ao ocaso enfrentado pela cidade que a hospeda. Em alguns pontos, como no caso do lixo, as semelhanças entre as cidades mostram que é necessário uma nova agenda para esse encontro.
Passado. Presente. E o futuro?
Apesar de centenária e de ser uma cidade baseada na produção e compartilhamento de conhecimento, é tímida a contribuição da UFRuralRJ para fazer com que Seropédica fuja do destino de ser mais uma cidade na zona de sacrifício do Rio de Janeiro. Desde a sua emancipação, em 1996, Seropédica carece de uma proposição efetiva da UFRuralRJ para direcionamento de esforços de pesquisas, transmissão estruturada de conhecimento ou criação de projetos para fomento de desenvolvimento social e econômico. Uma espera que se mostra complicada, pois, se aumentado o escopo da análise, vê-se que a UFRuralRJ passou ao largo de todo processo de transformação econômica, social e territorial que experimenta a região como um todo. Itaguaí, por exemplo, é atualmente um dos maiores pólos logísticos do Brasil. E qual competência, capacitações e recursos a UFRuralRJ procurou desenvolver nesta área, logística, nos últimos anos? Quantas disciplinas nesta área ela tem?
Existem mais evidências sobre os desdobramentos dessa relação na qual uma cidade sedia uma cidade universitária, mas o lixo, pelo contexto da criação do CTR Santa Rosa, chama muita atenção. Do ponto de vista teórico, sediar uma universidade do porte da UFRuralRJ é algo extraordinário, pois a presença dessas instituições é normalmente associada a expectativas de transformação da geografia social e econômica de uma região ou a materialização da imagem do conhecimento como alavanca para o desenvolvimento. Entretanto, no plano prático, o encontro entre Seropédica e a UFRuralRJ dá-se sem qualquer planejamento, o que impede que o melhor dessa proximidade seja aproveitado. Por exemplo, a prefeitura de Seropédica poderia lutar pela criação de um pólo de tecnologia baseado nas capacitações de pesquisa da UFRuralRJ. É mais inteligente e benéfico para uma sociedade ter empresas de base tecnológica do que receber um mega-aterro de lixo. O problema é que ainda são escassas as iniciativas ou oportunidades que sugiram que esse encontro será estruturalmente abordado, ao invés de pontualmente mencionado por ambas as partes quando lhes é conveniente.
Fronteiras abertas
São duas cidades bem diferentes e que parecem viver isoladas. Há tempos ouve-se tomadores de decisão das duas cidades falar em muros que separariam as cidades. A figura de linguagem usada para abordar a baixa qualidade de interação e relacionamento, os muros, não impede que se perceba que os sintomas mais se aproximam de miopia administrativa. Então, posto que uma nova agenda de interação e relacionamento clama atenção, mudar as lentes ou os óculos constitui uma figura de linguagem mais apropriada. Por exemplo, desde que foi criada, a ciclovia que liga o km 49 a UFRuralRJ não tem qualquer sinalização ou controle que torne o deslocamento por ela algo mais seguro, ordenado. Se não prestar muita atenção, qualquer pessoa que ali transita está exposta a um acidente, seja pelo tráfego de motocicletas ou ciclistas em alta velocidade.
É fato: a ciclovia está lá, mas nunca recebeu qualquer atenção estratégica ou algo que demonstre que o seu funcionamento está associado a metas específicas de ambas as cidades: meta de gestão da mobilidade, de política pública e de promoção da saúde da população, de incentivo para que a população de Seropédica se aproprie daquele gracioso espaço ou de conscientização sobre uso racional de energia ou sobre a questão da sustentabilidade. Nada acontece. É apenas uma ciclovia que um dia colocaram ali. Enquanto isso, a principal ligação entre as duas cidades continua sendo a rodovia Rio-São Paulo, fato que expõe, e de maneira desnecessária, um deslocamento do tipo doméstico, com veículos leves e pequenos, ao carregado deslocamento de cargas e pessoas em carretas, caminhões e ônibus rodoviários, isso em uma rodovia precisando urgentemente de aumento da sua capacidade. Realidade clara, objetiva, fácil de ser alcançada a olhos nus.
A fronteira há muito está aberta. A UFRuralRJ exerce inegável influência sobre Seropédica, mas no nível imediato, na dimensão econômica relativa ao consumo em lojas, serviços de alimentação e alugueis. É algo significativo, basta perguntar ao setor de comércio. O perfil de compra e consumo da população da UFRuralRJ é bem diferente do morador fixo de Seropédica. Este compraria, geralmente, em base mensal. Aquele faz compra semanal, objetivando a reposição de viveres que lhes satisfaça por, pelo menos, quatro dias na semana, contando que na sexta ele, se residente por perto, desloca-se para sua residência de origem. Sem essa demanda, boa parte do comércio local teria problemas de fluxo de caixa. Mas essa influencia econômica tem também seus reflexos negativos, como será visto mais a frente.
Diferenças entre as cidades
A UFRuralRJ, apesar do seu site não dar detalhes da sua população, tem altos índices sociais, culturais e econômicos. Ouve-se falar em quase 15000 pessoas, sendo que 75% seriam de estudantes. Da maior parte de sua população, os discentes, o menor nível educacional seria presumidamente o primeiro ano do segundo-grau, o do CTUR, Colégio Técnico. Ela apresenta algumas características básicas: ter um padrão de uso do solo amarrado ao fato de ser patrimônio cultural; ser um centro de captação de recursos econômicos; abrigar valiosa diversidade cultural; produzir e consumir diferentes tipos de serviços; atrair e gerar muitas viagens; não coletar e tratar seletivamente o seu lixo, com exceção dos resíduos laboratoriais; não ter tratamento de esgoto; não ter qualquer prática de uso racional da água ou energia consumida; não ter planejamento e gestão da mobilidade, acessibilidade e transporte; ter uma parca estrutura de atendimento médico para a sua população; ter uma agenda cultural e de entretenimento tímida, e ainda influenciada por um calendário de “choppadas” e festas sem qualquer vinculação com características culturais marcantes da nossa sociedade.
Produzir e compartilhar conhecimento, formar cidadãos, formam, em essência, a atividade fim da UFRuralRJ, e para isto o governo federal disponibiliza toda uma estrutura física, humana e de conhecimento. Também se caracteriza por ser uma cidade com alta taxa de renovação da sua população, o que pode ser observado a cada período de entrada e saída de alunos de segundo-grau, graduação e pós-graduação. Parte da população reside nos alojamentos, outra parte reside em Seropédica, fora do Campus. Uma outra parte vem para a UFRuralRJ e volta para casa. É uma cidade que tem sua dinâmica informada pelos horários de funcionamento das suas atividades, estes bem diferentes dos horários das atividades básicas dos moradores fixos de Seropédica. Muitos cursos já tem aula no período noturno, a biblioteca funciona até meia-noite. As festas de cursos da UFRuralRJ, a cada ano mais numerosa, também ocorrem em Seropédica, em clubes ou repúblicas, e atravessam a madrugada. Nos últimos anos, o número de cursos de graduação aqui sediados aumentou para 40. Apenas para análise, se cada curso fizesse por semestre a sua choppada, o calendário teria uma festa a cada 2,5 dias úteis. Em termos práticos, sabe-se que nem todos os cursos tem sua festa e que outros tem mais de duas.
Seropédica, por sua vez, tem na administração pública e nos alugueis suas principais atividades. É uma cidade que cresce sem qualquer instrumento que oriente esteticamente, funcionalmente e sustentavelmente a ocupação do seu solo, o que faz com que a beleza da UFRuralRJ contraste radicalmente com a poluição visual observada em seus bairros. Não há qualquer planejamento ou controle urbano que racionalize trânsito, atividades econômicas, hábitos e costumes, o que torna a cidade barulhenta, caótica. É uma cidade alçada por vias com pedágio ou repletas de quebra-molas e ocupações a beira da estrada. Logo, o padrão de deslocamento possível ou é caro ou é sofrível e demorado. É uma cidade que cresce apenas a beira da Rodovia Rio-São Paulo, o que, entre outros problemas, faz com que seus bairros sejam manchas urbanas isoladas, sem vias qualificadas e seguras para integração intrabairro e interbairro. Por esta razão, para poder desenvolver suas atividades básicas, diariamente a população de Seropédica expõe-se aos riscos de atravessar a rodovia. Não há transporte público regulamentado e que atenda as necessidades e características físicas e humanas ali encontradas. O transporte na cidade é feito em vans, kombis e motos, em condições críticas de organização e funcionamento.
Os números  relativos a cidade são escassos tanto quantitativamente quanto qualitativamente. O atendimento médico a população é precário, tanto na rede pública quanto na rede particular. O maior empregador é a prefeitura. Também aparecem na geração de emprego: empresa de ônibus, um fabricante de alimento, um fabricante de sacos plásticos, um supermercado, uma concessionária de rodovias e a UFRuralRJ. Seropédica não coleta e trata seletivamente o seu lixo; não tem boa estrutura de coleta e tratamento de esgoto; não tem qualquer prática de usu racional da água e energia consumida (a água de Seropédica é suja, apesar do fornecimento da Cedae); não tem planejamento ou gestão da mobilidade, acessibilidade e transporte; praticamente não tem calçada, expondo os transeuntes ao trânsito de automóveis e motos; tem uma agenda cultural e de entretenimento empobrecida, que se resume a festas promovidas pela prefeitura e igrejas.
Cidadãos diferentes expostos a mesma sorte
Enfim, como em todo tecido social, Seropédica e UFRuralRJ demandam serviços de transporte, hospedagem, saúde, alimentação, lixo, saneamento básico, segurança e entretenimento dignos. A UFRuralRJ apresenta alguma vantagem, mas as semelhanças iguala as duas populações a uma mesma sorte, o que deveria ser suficiente para que a população da UFRuralRJ tomasse a iniciativa de estimular que a organização repense e reveja a agenda do encontro entre as duas cidades. Uma vez na UFRuralRJ ou deslocando para ela, qualquer pessoa dessa comunidade está exposta a mesma sorte que assola o morador fixo de Seropédica. Se precisar de serviço de saúde, uma emergência médica que seja, um “cidadão da UFRuralRJ” estará exposto ao mesmo ocaso, ao mesmo suplício, ou seja, a um dos piores índices de saúde do Rio de Janeiro. Ao se deslocar pelas vias que ligam Seropédica está-se exposto aos mesmos riscos de acidentes. Ao residir em Seropédica, enfrentando a desordem e caos urbano, qualquer membro da UFRuralRJ é uma vítima, e, ao mesmo tempo, culpado, se não observar e realizar uma mudança significativa na maneira como desenvolve suas atividades e cria e honra os limites que demarcam e respondem pela qualidade de vida.
Diferentes facetas, além da econômica, podem ser vistas no encontro entre as duas cidades. A UFRuralRJ influência o aumento do trânsito local, pois parte da sua população começa a usar de maneira contumaz carros e motos. Outra utiliza bicicleta ou simplesmente exerce a marcha a pé. Ela tem impacto sobre o mercado de transporte, pois boa parte da população da UFRuralRJ usa com freqüência o transporte alternativo. Uma das influências mais marcantes está no encontro dos estilos de vida e padrão de desenvolvimento de atividades totalmente diferentes dos alunos e dos moradores fixos de Seropédica. A atividade noturna dos alunos é intensa, baseada em festas que por vezes ultrapassam as horas da madrugada, enquanto a vida da maioria dos moradores de Seropédica começa na madrugada, e para trabalho. Muitas das vezes festas barulhentas, desconsiderando que os vizinhos precisam de paz e conforto para começar um dia que, para boa parte deles, implica em horas de deslocamentos dentro dos ônibus da Real Rio.
No que diz respeito aos alugueis, caminha-se para uma situação extremamente delicada. Em função do crescimento do número de cursos da UFRuralRJ e do fato de Seropédica só ter o mínimo de condições para se habitar à beira da estrada, os alugueis aumentaram absurdamente. Preferida pela população da UFRuralRJ, os valores de alugueis praticados nesta área da cidade praticamente inviabilizam que um típico residente fixo de Seropédica possa ali viver: a renda média é baixa. Muitos colocam suas residências disponíveis para aluguel, aproveitando os bons preços. Resta aos moradores ocupar outras partes da cidade, infelizmente as que apresentam as mínimas condições para se levar uma vida de qualidade.
Por uma nova agenda para esse encontro
Como visto, o serviço que a foto do jornal oferece é outro. Ela é uma evidência importante para que comece-se, urgentemente, a analisar de maneira mais detida e estruturada o padrão de influência que a UFRuralRJ exerce e pode exercer sobre a realidade de Seropédica e do seu entorno. É a abertura de uma nova agenda para esse encontro. É a mudança da lente, a melhoria da acuidade visual, o aumento da empatia, a disponibilização para a interação. É a produção de novas e melhores fotos desse encontro.
Muito ainda há para ser feito no plano básico, como o de sensibilizar e conscientizar os moradores dessas duas cidades sobre a realidade do outro, para que se aprenda ver e respeitar os limites que demarcam e respondem pela qualidade de vida. Existem várias oportunidades para abrir novas janelas e portas de interação entre as duas cidades, principalmente a partir dos conhecimentos desenvolvidos nos cursos e institutos. Quanto conhecimento sobre ervas medicinais, plantas, árvores, alimentos, animais e processos tem-se disponível na UFRuralRJ para ser aplicado objetivamente em Seropédica? São muitas as janelas e portas que levariam a um maior intercâmbio cultural e de compartilhamento de conhecimentos e experiências. Algo rico, denso e de muito valor e peso não apenas no currículo vitae, mas na memória da alma e da pele, como o faz um Projeto Rondon.
Figurativamente falando, o que aconteceria se abríssemos uma nova entrada da UFRuralRJ pela rua 11, a rua da Delegacia? Atualmente a UFRuralRJ está voltada para a Rodovia, para a Pesagro. Com esta nova entrada, ela se voltaria para dentro de Seropédica, não para a beira da estrada. Parte daqueles que usam diariamente a rodovia teriam uma nova opção para se apropriar do gracioso espaço da UFRuralRJ e para desenvolver suas atividades. As mudanças no fluxo de pessoas tem potencial para influenciar o deslocamento de atividades da beira da estrada para dentro do bairro ou gerar novas atividades, o que levaria a uma transformação na paisagem do bairro, na experiência de cidade. É para imaginar, ousar, sair do lugar comum, enfim, criar uma nova agenda.

sábado, 2 de abril de 2011

A crônica de Seropédica


A crônica de uma cidade é um retrato da vida da cidade. É um instantâneo que revela a dinâmica do seu cotidiano e que, numa leitura mais ampla, revela os movimentos que simbolizam suas ambições, potenciais, vocações ou possibilidades. Os vários retratos tirados, somados, alimentam lendas e o folclore; revelam um mapa, dinamicamente transformado, que explica o destino da cidade e sua inserção no mundo. As crônicas são marcadas pelas facetas do dia-a-dia, por seus contextos, históricos ou pontuais, e pela trajetória das suas personagens. A vida de uma cidade, seu futuro, sua sorte, pode resultar de ações e projetos que explorem suas vocações e potenciais ou de ações e projetos que a conferem vocações. Por exemplo, o plano siderúrgico brasileiro deu a Volta Redonda a vocação para o metal-mecânico. Por sua vez, a região litorânea tem o potencial turístico, algo importante para criar a vocação turística.
Da trajetória de personagens, cristalizam-se os homens comuns e emergem heróis e vilões, figuras que, sozinhas ou acompanhadas, são decisivas para a história da cidade. Apostas, feitos, recursos aportados, ideais, valores, traços comportamentais e de caráter, misturam-se numa complexa interação para gerar os desdobramentos que sinalizam o possível amanhã e que constantemente redesenham o mapa. A história não para: surgem os registros, os relatos, suas interpretações e reinterpretações, enfim, todo material essencial que alimenta as crônicas.
A história de Seropédica ─ curta enquanto cidade, longa enquanto distrito de Itaguaí─ tem suas crônicas apontando para dois momentos, e são marcadas pela natureza dos movimentos e dos mapas que aparecem. Em um primeiro momento, de relatos históricos, abundantes, e de alguns registros, escassos, emergem crônicas de uma cidade vivida por pessoas que, oriundas de outro lugar, ali escolheram (ou não tinham escolha) ficar para construir suas vidas, e por ideais alimentados e compartilhados de emancipação que levaria o distrito a condição de cidade da qual se poderia orgulhar. Estas crônicas revelam um mapa das ambições de uma sociedade que, com o tempo, foi inquietando-se com a condição de distrito, mobilizando-se com intensidade para transformar sua sorte.
Ambições estas simbolizadas por movimentos de enraizamento de recursos (investimentos), de cultivo de idéias modernizantes (comitês de especialistas) a espera de projetos que fariam germinar e crescer, reproduzir, transformar, prosperar. Tudo a partir de uma lógica escorada na posse de uma generosa extensão de terra, de uma grande universidade e de uma localização estratégica. A cidade pintada na crônica diária revela um excelente potencial econômico a ser explorado, materializado pela proximidade com grandes centros de conhecimento e de consumo, conformando um mapa repleto de vias que levam e trazem o desenvolvimento, garantindo uma boa inserção “no mundo” para a cidade.
Com o tempo, essa realidade muda e a característica marcante da crônica de Seropédica é a apatia de uma cidade que simplesmente para e observa o vai e vem de um mundo em constante movimento. Não é a crônica de uma cidade que é destino ou partida para personagens cujo cotidiano, iniciativas, sonhos, trajetórias e feitos rendem histórias fantásticas, escritas por elas mesmas. Cidade aonde pessoas querem estabelecer raízes, semear e cultivar novas idéias modernizantes, e aonde alguns empreendedores aportariam seus recursos em projetos capazes de criar novas realidades positivas. Nem é uma cidade para onde pessoas se dirigem para conhecer, entreter, envolver ou explorar as coisas boas ali estabelecidas por seus personagens e positivamente transformadas pelo tempo. É a crônica de uma sociedade imobilizada, a beira de uma estrada, observando o tempo passar.
A atual crônica de Seropédica é a de uma cidade de passagem; de um trecho do caminho de viajantes; de um episódio ou temporada na vida de pessoas que por ali passaram, e que, além do consumo necessário para sobreviver e do aluguel que pagaram, pouco fizeram ou encontraram. É a crônica de uma cidade cujos moradores ficam observando pessoas de fora escreverem, ao seu jeito e ritmo, a história da sua cidade; é a crônica daqueles que para ter uma vida melhor e mais digna precisam sair para se qualificar e obter ocupação mais atraente; é a crônica da cidade que tem uma grande universidade, mas com ela não se integra ou se deixa integrar. A universidade, que movimenta inúmeros recursos, conhecimentos e pessoas qualificadas, deles pouco consegue aproveitar para transformar a realidade da cidade. Nesta crônica, o conhecimento, e seus atores, apenas passam por Seropédica.
É a crônica da cidade que, sem qualquer planejamento ou alguma intervenção estruturada do seu poder público, cresce apenas numa faixa do território, a beira da rodovia. A beira da estrada, e em função dela, emergem as facetas do dia-a-dia, constroem-se contextos, históricos ou pontuais. Ali surgem personagens, dão-se os fatos, estabelecem-se trocas e laços. Ali ficam os pontos de ônibus, bancos, lojas, bares, praças e serviços e é para ali que as pessoas se deslocam diariamente, deixando para traz as esvaziadas ruas das suas comunidades, que não tem nada para entretê-las, oferecer ou que as faça sentir que pertencem aquele bairro ou comunidade. Ali se constrói todos elementos que conferem uma identidade para a cidade.
A beira de uma rodovia, resolvendo seus problemas, trabalhando ou se entretendo, os cidadãos de Seropédica observam, dia após dia, o mundo passar. Passam carros, motos e caminhões, carregados de materiais, produtos e pessoas que simbolizam um mundo abundante em conhecimento, produção e consumo. Mundo do qual os moradores da cidade, com raras exceções, fazem parte ou dele conseguem aproveitar. De domingo a domingo fica-se a beira da estrada assistindo ─ conformado ou deslumbrado ou assustado ─ ao vai e vem de tecnologias, diferentes a cada ano, simbolizando a história de um país e de um mundo em crescente riqueza e, logicamente, em movimento. Passagem que deixa poluição ambiental, sonora e incidentes de um convívio, sem segurança ou proteção alguma, entre os cidadãos e um tráfego cada vez mais crescente e hostil.
Na história da cidade crescem os relatos e registros de famílias que perderam entes em atropelamentos e demais acidentes, ou dos entes que saíram para viver melhor. Algumas pessoas contam histórias sobre caminhões que tombaram e cargas que foram saqueadas; sobre vítimas que viram neste ou naquele acidente enquanto caminhavam pela ciclovia. As pessoas falam dos longos engarrafamentos, esboçam, com poucas e rápidas palavras, a condição de profunda impotência que lhe é conferido pela maneira de governar e pensar essa cidade. Outras coisas são facilmente observadas. Assiste-se ao crescimento desordenado da população universitária e do aumento do tráfego interno de carros, mototaxis e vans. Não se tem sinalização, calçadas, ou a quem recorrer diante o inesperado. Assiste-se aos trens passarem, levando e trazendo riquezas, conhecimentos aplicados, e que param apenas por causa dos sinais fechados e dos acidentes. Os trens não param para abastecer empresas que ali estão, geram empregos e riquezas, a partir de conhecimentos desenvolvidos na universidade ou ali enraizados. Em breve Seropédica terá o arco-rodoviário passando pelo seu território, e dele poderá não usufruir, pois a cidade corre o risco de não receber uma alça rodoviária para nele entrar ou sair.
Dentro em breve, desse mundo de riqueza que se observa passar, em vias cada vez mais numerosas, a crônica de Seropédica registrará, e com grande freqüência, os fatos oriundos de um vai e vem que materializa o ocaso da sonhada cidade próspera. Será a crônica do “ir” de areia bruta e barata, extraída de seus imensos e poluidores areais. A areia inicia o processo de construção de um mundo rico que não para, como a Barra da Tijuca. O mundo cresce enquanto Seropédica se diminui, se esburaca. Será a crônica do “vir” do lixo do Rio de Janeiro, da Cidade Maravilhosa, oásis do mundo do consumo, que nunca para de crescer, de receber turistas, e de produzir lixo.
A atual crônica de Seropédica é a crônica da cidade imobilizada que vê o “mundo” passar pelas suas vias; que vê o mundo se reinventar em seu conhecimento, riqueza e poder; que vê o mundo se esvair em consumo; e que no mundo se insere na impotente e demiritória condição de sua lixeira.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Voltar a normalidade: outro desafio para a Região Serrana.

A população da Região Serrana, após duas semanas de anormalidade, de exceção, passa a enfrentar o desafiador recomeçar. A primeira exceção ficou por conta do encontro fatal entre um evento extremo da natureza, chuva em quantidade acima do normal e concentrada, e cidades mal planejadas e mal gerenciadas, resultando em centenas de mortes. A outra exceção ficou por conta do contato da região com a efetiva e significativa presença do poder público estadual. Sim, exceção. Aquele encontro entre a população e o aparato do poder público estadual, o “abraço institucional” que atende, assiste, ordena, incentiva, fomenta, regula e democratiza não é regra, é exceção. Ironicamente falando, aquele é um “governo estadual de exceção”.
O “governo estadual de regra”, o poder público com o qual estamos acostumados, é o que há tempos promove a experiência desumana que aceitamos sem reagir: a do abandono institucionalizado. Poder público que marca pela ausência, imperícia, negligência e incompetência de muitas das pessoas investidas nos cargos ou que ocupam funções que dizem respeito a atribuições, responsabilidades e competências governamentais. 
Neste caso, merecem destaque os governadores e deputados estaduais, principais responsáveis pelo desmonte e desqualificação dos diversos órgãos estaduais que responderiam pelo “abraço institucional estadual”, o abraço que certamente diminuiria e muito os riscos de que eventos como estes da região serrana aconteçam. O abraço que não deixaria acontecer as misérias que os jornais e rádios noticiam todos os dias. Estes políticos desmontaram e desqualificaram os órgãos estaduais por meio do loteamento dos cargos, das contratações oportunistas através de cooperativas, dos salários baixos, da carreira desmotivadora, dos concursos e concorrências fraudulentos, da falta de treinamento, do fornecimento de material de baixa qualidade etc. Uns chamam isso “Choque de Gestão”.
Em seu recomeçar, a Região Serrana já começou a experimentar “o governo de regra” e ficam as expectativas com algumas conseqüências de decisões tomadas no “governo de exceção”. Com relação a regra, a mídia começou a dar destaque, no último final de semana, para a saída do aparato que foi montado após a tragédia. Entre outras coisas, relatou-se que não há assistentes sociais e psicólogos oferecendo atendimento em uma freqüência que auxilie as pessoas a enfrentarem os dramas do recomeçar. Muitos simplesmente perderam tudo, materialmente e simbolicamente falando. Já são relatados problemas de aumento do consumo de álcool. Imaginem o que significa recomeçar sem apoio depois de uma perda dessa!
As expectativas com as decisões tomadas no "governo de exceção" relacionam-se a criação, por exemplo, de um condomínio em uma fazenda, fato que criará um novo bairro. As pessoas vão entrar em contato com a capacidade e experiência do poder público estadual para fazer política de e para promover a ocupação do espaço urbano. 
O mesmo poder público que deixou que as ocupações irregulares do solo urbano proliferassem. O mesmo poder público que criou Vila Aliança, Vila Kenedy, Cidade de Deus e Nova Sepetiba. Por exemplo, se for aplicada naquela região a visão que norteou a criação de Nova Sepetiba, as pessoas ficarão em um conjunto residencial com casas pequenas e espremidas, sem arborização, e bem longe das atividades que compõem a vida delas. Experiências como a de Nova Sepetiba mostram o que significa despejar pessoas nas periferias, sem oferecer qualquer política de criação e fomento de atividades que evitem o sacrificante deslocamento de horas em meios de transporte com péssimo nível de serviço. Essas experiências mostram o que significa ficar em abandono institucional, exposto a regra do possível, sem a presença do poder público que atende, assiste, ordena, incentiva, fomenta, regula, humaniza e democratiza.
As pessoas vão conhecer o “governo de regra”, o mesmo que deixou que a siderúrgica CSA se instalasse onde se instalou, sem que houvesse qualquer projeto para transformação urbanística daquela região, uma das mais abandonadas da cidade carioca. É o poder público que agora ameaça punir a empresa, como se não tivesse havido tempo e recursos para prever e evitar o que tem acontecido. É o poder público que aceita como normal a aplicação de bilhões de reais para demolir parte da Perimetral, enquanto moradores da periferia da cidade enfrentam péssimas condições para habitar.
É o mesmo “governo de regra” que disse sim para instalação do Aterro Sanitário em Seropédica, apesar de todas as considerações feitas pelos professores da UFRuralRJ, pesquisadores da Embrapa e pelo CREA com relação a problemas no EIA-RIMA. O caso de Seropédica mostra para as vitimas da Região Serrana e para todos nós, vítimas ou não, como que o poder público estadual entende a relação centro-periferia. Pelo que parece, eles agora vão para a periferia.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Transcrição (autorizada) de mensagem da vereadora Maria José (25-01-11)

Companheiros de luta,

O mês de janeiro foi um mês de recesso (férias) e também de angústia para quem sabe o que representa  para Seropédica e região o CTR Santa Rosa. Costumo referir-me a esse atentado contra o povo de Seropédica como ferida aberta a sangrar. Aberta pelas facas afiadas dos políticos desta cidade e adjacências, que através de atos administrativos (ou pela omissão) esfaquearam o povo pelas costas, abrindo as portas para tamanha covardia! Igualmente maldosos e covardes, as autoridades do Rio de Janeiro demonstram o menosprezo com um município pequeno, mas que tem uma população que merece o mínimo de respeito.

Bem, feito o desabafo, entendo que não basta chorar e lamentar. Conforme foi sugerido na Audiência Pública  de 08 de dezembro de 2010, um grupo deve analisar o licenciamento para, de maneira objetiva, apontar suas falhas, bem como cobrar o Plano de Operação para enviar ao Ministério Público e INEA.  Também para subsidiar ações contra a operação do Aterro e analisar meios de solucionar e ou minimizar essa tragédia.

Para isso, peço aos guerreiros de plantão que disponibilizem datas (as mais próximas possíveis) para que possamos nos encontrar e tratar do assunto. 

Att. Ver. Maria José.
majosales@hotmail.com

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

A UFRuralRJ que queremos e a que não compreendemos

Na audiência pública na Câmara de Vereadores de Seropédica de 8 de dezembro de 2010, um dos pontos de maior destaque foi o contato que a sociedade seropedicense teve com o potencial da UFRuralRJ para ajudar a enfrentar os problemas que a afligem e para viabilizar transformações estruturadas da sua realidade. Na ocasião, em função da dinâmica das apresentações, emergiu uma questão: por que a UFRuralRJ ainda não entrou na Justiça Federal com uma ação de vizinhança contra o CTR?

Quem esteve na audiência viu o que alguns professores tinham a dizer sobre a polêmica implantação do CTR. Falou-se sobre os riscos da implantação e sobre soluções para o problema. É a UFRuralRJ que queremos: interagindo com Seropédica, transferindo conhecimento e tecnologia, viabilizando desenvolvimento econômico e social.

Desde o início das manifestações contrárias a implantação do CTR em Seropédica, alguns professores mostram os impactos ambientais e sociais relativos a esse empreendimento, ilustrando as falhas no processo de licenciamento. No dia 8, além de termos esses professores reafirmando suas posições, foram apresentadas propostas alternativas ao CTR. Propostas estas baseadas no entendimento de que soluções macro de grandes instalações, como um CTR, não são viáveis para quaisquer tipos de tratamento de resíduos, e que as mais recomendáveis seriam as soluções micro, como os “ecopolos”, que atendem de modo celular o tratamento de resíduos sólidos. Estes “ecopolos” possibilitam resultados que levam a redução de, aproximadamente, 95% dos resíduos coletados. O resíduo final poderá ser destinado a aterros sanitários ou finalizado pela construção civil, sendo transformados em materiais cimentíceos, cerâmicos e outros.

Essa apresentação resultou de encontros promovidos pela UFRuralRJ e Secretaria de Meio-ambiente de Seropédica com empresas que tivessem interesse em apresentar alternativas para o tratamento dos resíduos. Cinco empresas foram chamadas, mas só duas apareceram. Elas apresentaram soluções que dizem respeito a geração de energia (via incineração de resíduos), geração de material para uso em pavimentação e geração de material para uso cimentício.

Todas as soluções apresentadas visam a eliminação de aterros sanitários, e são condizentes com a Política Nacional de Resíduos Sólidos (“PNRS”), lei 12.305 de 02 de agosto de 2010. Vale destacar que as áreas ocupadas pelos empreendimentos sugeridos são da ordem de 10% da área ocupada por um Aterro Sanitário! Existindo, ainda, a possibilidade de instalação de um pólo de reciclagem de resíduos sólidos (RS), onde microempresas e Institutos de Pesquisa possam realizar e/ou desenvolver práticas de reuso, reciclagem e beneficiamento, valorizando os resíduos sólidos.

A UFRuralRJ que não entendemos é esta mencionada várias vezes aqui no Diário da Lixolândia: a que sempre chega atrasada aos eventos mais marcantes dessa região. Desta vez, ela também chama atenção por ainda não ter acionado a Justiça Federal contra a implantação do CTR. É estranho não ter um movimento mais contundente da UFRuralRJ contra o CTR. Destacam-se duas razões. Primeiro, os elementos levantados pelos professores envolvidos no movimento contrário ao CTR, frutos da aplicação de seus recursos de pesquisa, considerações do mais alto nível, ainda permanecem sem receber o devido “abraço institucional” da Instituição que a estes profissionais abriga. Segundo, em um tempo onde se sabe que transformações estruturadas de um território ou região dependem da aplicação de conhecimento e tecnologia, acolher um CTR, tendo a UFRuralRJ por perto, é um desmerecimento a eminência dessa Instituição.  

De acordo com um experiente ativista contra implantação de CTRs, Leonardo Aguiar Morelli, presente na audiência, acionar a Justiça Federal gera mais resultado do que ficar acionando a instância jurídica estadual. É um conselho oriundo da experiência de uma pessoa em uma luta pesada contra o contexto obscuro que se tornou a coleta e descarte de lixo no Brasil. Como se trata de um órgão federal, a UFRuralRJ tem essa prerrogativa, pode acionar a Justiça Federal, o que daria ao movimento contra o CTR uma nova dinâmica. Ao mesmo tempo, daria um novo alento a todos aqueles que querem uma Seropédica reconhecida por outras razões que não a de possuir um dos maiores aterros sanitários do Brasil. 

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Ano novo, vida nova?

A falta de postagens mais atualizadas no Diário da Lixolândia tinha uma razão: observar a transição dos poderes legislativo e executivo e as novidades que emergiriam.
Novos Governadores, Deputados e Senadores tomaram posse. Novos nomes foram colocados nas Secretarias e Ministérios que compõem a Administração Pública nas diversas instâncias de governo. Uma nova presidência da Câmara Municipal foi eleita, alçando ao poder o vereador Dedé Bananeiro. Havia grande expectativa com relação as decisões relativas ao meio-ambiente, tema que dominou o cenário da eleição presidencial em 2010, e que alçou Marina Silva a condição de celebridade mundial. Neste sentido, havia expectativa sobre o que o novo secretário estadual de Meio-ambiente, Carlos Minc, faria com relação a instalação do Aterro Sanitário (CTR), em Seropédica. Havia, logicamente, expectativa com relação ao que o governo municipal traria de novo para essa cidade.
Há uma grande expectativa, mas até agora nada de novidades positivas. Em verdade, as novidades são extremamente negativas, pois dizem respeito a tragédias que tomam a proporção que vemos por causa do histórico descaso dos políticos brasileiros com: planejamento e administração de longo prazo; políticas apropriadas de transporte e uso do solo; alertas de profissionais e de instituições de pesquisa; e escolha de pessoas realmente capacitadas para assumir as secretarias responsáveis pelas decisões que garantem vida digna no campo e nas cidades. Além do descaso, tem os ganhos pontuais dos políticos, que, infelizmente, se beneficiam ao liberar loteamentos e construções em áreas não apropriadas, ao colocar nos cargos técnicos pessoas associadas ao financiamento e manutenção de esquemas de campanha. E o que é pior: em situações extremas, como as tragédias naturais, eles podem usar o dinheiro público sem fazer licitação. A próxima eleição é o horizonte máximo de tempo que alcança a visão de um político responsável pelas decisões que vão afetar de maneira drástica as nossas vidas.
Infelizmente, é o mesmo descaso que observamos no processo de implantação do CTR em Seropédica. Profissionais da UFRRJ, EMBRAPA e CREA já alertaram sobre as questões do aqüífero, a contaminação do solo, as inconsistências da tecnologia que será usada pela Ciclus S/A e do EIA/RIMA sancionado pelo INEA. Viu-se que Seropédica, a Lixolândia, não tem qualquer plano estratégico de uso do seu solo, pois cedeu para a instalação de um aterro sanitário de proporções gigantescas uma área que poderia ser um grande parque municipal em uma nova reorganização do crescimento da cidade. Viu-se que Prefeitura e Câmara foram irresponsáveis ao liberar o alvará de instalação e funcionamento do CTR. Sabe-se que a escolha dos secretários municipais de governo atende a critérios toscos como laços familiares, amizade de longa data e acordos políticos. Sabe-se que a empresa responsável pelo CTR é a mesma que cuida do transporte de lixo na cidade do Rio de Janeiro e da terceirização da frota de órgãos estaduais. Sabe-se que essas empresas tem liberdade para contribuir economicamente nas campanhas políticas. Sabe-se que a remoção e acomodação do lixo urbano geram milhões de reais em contratos que não são devidamente analisados e rastreados.
A tragédia ambiental de Seropédica é anunciada, e vai levar tempo para ser notada e lamentada. Ela não terá o impacto de centenas ou milhares de morte imediatas, como vemos atualmente no estado do Rio de Janeiro. A despeito de todos os avisos feitos pelos profissionais da UFRRJ, EMBRAPA e CREA, os governos Estadual e Municipal ainda não fizeram nenhum esforço para olhar em conjunto, e de maneira realmente pública, a questão. Sim, o horizonte de tempo que esta tragédia levará para se anunciar não é o da próxima eleição. 
Até agora, ainda que estejamos apenas no dia 14 de Janeiro de 2011, Carlos Minc só se manifestou com contundência sobre a poluição provocada pela siderúrgica CSA, em Santa Cruz. Poluição esta que, por gerar problema agora, de imediato, tem a atenção da mídia. De parte da prefeitura de Seropédica, até agora, nenhuma novidade.


Lementavelmente ficamos preso a um ciclo vicioso e perigoso: "aonde estão problemas que dão audiência imediata está a mídia. Lá também estarão os políticos". Sim, políticos, aqueles que podem faturar ao tomar decisões que vão afetar de maneira drástica as nossas vidas.